17 setembro, 2012

Um problema de tesouraria?

http://bibo-porto-carago.blogspot.com/

Nos tempos que correm o tema dominante é o do crédito (ou falta dele) à economia, com reflexo na vida de todos. Assuntos como liquidez, solvabilidade, tesouraria, cash-flows são recorrentes no dia-a-dia.

No caso do nosso FCP como estamos nesta matéria?

A sensação geral é a de que passa por grandes dificuldades, nada que não seja comum a toda a economia envolvente (país, empresas, famílias, cidadãos). E, de facto, também nós temos sérios problemas nesta área. Mas, sobre isto nada melhor que deixar falar quem bem posicionado está para o fazer: o ROC (revisor oficial de contas) da FCP-SAD.

No seu parecer sobre as contas do exercício findo em 30 de Junho de 2011 diz ele na sua Certificação Legal das Contas e Relatório de Auditoria ( páginas 95 a 97 do Relatório e Contas Consolidado 2010/2011), a titulo de ênfase (isto é, sinal de alerta):
    “Adicionalmente as demonstrações financeiras naquela data apresentam um fundo de maneio negativo... As demonstrações financeiras anexas foram preparadas no pressuposto da continuidade das operações, que assume a manutenção do apoio das instituições financeiras, bem como o sucesso futuro das operações, incluindo o resultado da alienação de direitos de inscrição desportiva de jogadores, tal como previsto nos orçamentos de exploração e tesouraria, essencial para o equilíbrio e cumprimento dos compromissos financeiros assumidos.”
De facto, a existência de um fundo de maneio negativo é um mau indicador financeiro. Em que consiste? Genericamente na diferença entre ativos correntes e passivos correntes. Se é negativo é porque os passivos são superiores aos ativos. E o que são ativos e passivos correntes? Sinteticamente, créditos sobre terceiros (ativos) e dívidas a terceiros (passivos) com vencimento no prazo de até um ano.

Concretamente, no caso da SAD, quais são exatamente os números?

Pois bem, baseando-me nos últimos dados conhecidos (Relatório e Contas Consolidado do 3º Trimestre 2011/2012, isto é à data de 31/03/2012) a situação era a seguinte:
    Ativos Correntes - total de 52.683.659 euros
    Passivos Correntes - total de 167.533.480 euros
Daqui conclui-se que as contas apresentam um brutal fundo de maneio negativo. Preocupante? Obviamente que sim (e, daí, a ênfase do ROC). Assustador, face à dimensão do desequilíbrio ? Não, e passo a explicar tendo para isso de desagregar estes ativos e passivos correntes.

Ativos Correntes:
  • inventários - 912.388
  • clientes - 40.772.541
  • outros - 6.937.202
  • caixa - 4.061.528

  • Passivos Correntes:
  • empréstimos bancários - 49.993.423
  • empréstimos obrigacionistas - 18.226.996
  • outros credores - 13.400.330
  • fornecedores - 45.423.404
  • outros passivos correntes - 38.564.678
  • provisões - 1.924.649

  • Ora bem, se nos ativermos apenas ao que temos a pagar a fornecedores, comparando com o que temos a receber de clientes, a situação não é fácil mas é gerível.

    O problema está nos empréstimos em que não temos condições para os pagar.

    Quanto aos empréstimos bancários à medida que se forem vencendo terão de ser substituídos por novos empréstimos, obviamente em muito piores condições de taxa de juro, o que terá impacto negativo em exercícios futuros.

    Quanto ao empréstimo obrigacionista que se vence agora (Dezembro), certamente que dentro em breve vamos ouvir falar em nova subscrição.

    Uma última mas importante nota (até para tranquilizar um pouco quem tenha ficado assustado com números tão negativos). A análise feita é estática, isto é reporta-se a um dado momento. É uma fotografia em 31/03/2012.

    Entretanto, como todos sabemos, desde então venderam-se passes de jogadores por valores muito relevantes, tendo-se comprado pouco, o que seguramente veio aliviar a pressão sobre a tesouraria (não esquecendo que os recebimentos e pagamentos são faseados), tornando a fotografia um pouco mais agradável. Neste quadro, julgo que melhor se entenderá a absoluta necessidade da operação Hulk, aliás a não ter sido feita temia bastante pela nossa saúde financeira a muito curto prazo. E, mesmo assim, há que continuar a monitorizar a situação com todo o cuidado e preocupação.


    nota: o blog BPc agradece ao JCHS a elaboração deste artigo.

    9 comentários:

    1. Análise lúcida que deveria sevir de alerta para os sócios estarem mais atentos e serem mais participativos na gestão do Clube.
      E repare que falo em Clube e não SAD, porque segundo creio o FCP ainda tem maioria do capital da Sad -ao contrário dos outros - e, se assim for, somos nós, os sócios do Clube que em, maioria temos de dizer CHEGA!
      Chega de honorários verdadeiramente pornográficos e prémios verdadeiramente escandalosos aos administradores,por classificações mesmo ficando em terceiro(!) lugar na liga.
      Que é feito dos encaixes financeiros que tem sido feitos ao longo dos últimos anos com a venda dos passes de jogadores - com mérito indiscutível pelos valores conseguidos - mas que não se refletem nos relatórios ou então são lá minimizados por negócios esquisitos onde se pagam 27 milhões por 2 defesas (não está em causa o valor dos atletas), atletas importados às resmas para "rodarem" em clubes periféricos que só existem por essa via. havendo casos já nos escalões inferiores.
      Eu não sou adepto de nenhum banco, SOU SÓCIO DO FUTEBOL CLUBE DO PORTO, portanto quero que a Sad se f*****, quero o meu clube gerido de forma sadia.
      Espero não sofrer o desgosto da falência técnica até morrer, mas a fazer fé nos numeros apresentados, não tenho muita fé, não....

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    2. Não foi por acaso que o hulk foi vendido ao preço que foi. qualquer clube interessado em saber a realidade do nosso FCP consegue ver que poderia fazer um bom negocio com o incrivel. ao fim ao cabo, se, quando esta "fotografia foi tirada", ela estivesse saído melhor, o preço do hulk seria mais alto.

      VIVA O PORTO!

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    3. Caros amigos
      Concordo com tudo o que está no artigo. O que me preocupa bastante é o valor a que chegou (desceu) o Capital Próprio. Apenas gostaria de rectificar o número das páginas relativas ao parecer do ROC. As pág. 95 a 97 citadas referem-se ás Contas Individuais. Nas Contas Consolidadas o parecer está nas páginas nos. 106 a 108.
      Foi só uma questão de pormenor, desculpem o preciosismo.
      Abraço

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    4. Em 30/06/2002, o passivo era 51.000.017 €.

      Em 31/03/2012, o passivo era 214.171.035 €.

      Aumentou 163.171.018 €, ou seja, 420%.

      Soma e segue.

      Enquanto ganharmos campeonatos ninguém quer saber das contas para nada. É só "Pinto da Costa, olé, olé".

      Quando estivermos 3 ou 4 anos sem ganhar, aí será tudo posto em causa e os administradores terão problemas. Até lá, é à fartazana!

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    5. Eu também sou sócio do clube e não da SAD, mas pelo que sei, e sei pouco, não podemos viver sem ela, mas há sócios do nosso clube que não querem saber das contas para nada,têm a mania que são ricos,pois acham que não se deviam vender jogadores, e depois,viviamos como? Há que ter os pés bem assentes na terra, para continuar-mos a ganhar, tem que se vender bem e comprar melhor.Parece que agora a politica é reduzir as despezas, espero que tenham engenho e arte para podermos continuar a Vencer.
      Abraço
      manuel moutinho

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    6. Caro marujo,

      Tem razão. O passivo aumentou 163 milhões porque se venderam jogadores, pois não somos ricos.

      Pense lá um bocadinho e veja lá se isto faz algum sentido. As vendas não fazem aumentar o passivo. As compras, sim. Os empréstimos bancários, sim.

      O passivo aumentou porque se gastou muito mais do que se devia.

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    7. Caro José Lopes
      Construímos um Estádio e um Pavilhão, lembra-se?
      E o Activo em 30 Junho 2002 era 85.606€ e em 31 Março 2012 215.192€
      Mas compreendo o seu raciocínio, e segundo julgo saber, a SAD, está a fazer um esforço de contenção nas despesas.
      Veja, por exemplo, a quantos jogadores está reduzido o nosso plantel.
      Abraço

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    8. em primeiro lugar, agradecer a disponibilidade do JCHS perante o BPc para ajudar a explicar/perceber algumas coisas destas contabilidades que são um bicho de sete cabeças para muito e tantos Portistas.

      depois, dizer que, perante tal simplicidade de escrita e de explicação, continuar a não perceber algumas coisas, já é um abuso ;)

      esperam-se portanto mais posts ao mesmo nível, clarinhos como água, e simples quanto baste.

      no resto, quanto aos números em si, de facto, diria também que muitas vezes, mesmo não percebendo nada da coisa, me interrogo muitas vezes como é possível vender-se, vender-se, vender-se, vender-se... e o passivo cada vez mais aumentar... mas lá está, como não percebo muito, ou pouquissimo diria, acabo quase sempre a bem abrir a boca para não dizer asneira... e da grossa.

      em parte, comungo se calhar de uma opinião mais centrada no facto de se gastar mais do que se deve... ou que se tem.

      os resultados disto? os desportivos, nem se discutem, tamanha tem sido a limpeza... mas será que, um dia, não possam vir a pagar alguns excessos, alguns, repito, que poderiam ser evitados? até porque a economia global, no seu todo e no geral, há muito que o tempo da vacas gordas se acabou e olhando-se para a nossa realidade, não sei até que ponto este nosso tipo de gestão desportiva dos últimos anos, não tem que ser repensada e baixar um pouco o "nível de risco", caso contrário, um dia destes, pode-nos sair caro, bem caro.

      mas volto a repetir, sou leigo, um quase leigo invertebrado nesta matéria, daí que, uma coisa é o que penso, outra bem diferente, é o que demonstrem os números... daí que a minha margem de dizer asneira, é altíssima.

      deixo a palavra nos entendidos e em quem percebe da poda... eu, limito-te a ler, tentar perceber e ao mesmo tempo, ir interpretando, e acima de tudo, ir aprendendo pa ganhar opinião mais válida e mais firme sobre estas coisas das economias, que a mim, muitas vezes, me dizem que, nem sempre o 1+1 é igual a 2, vá-se lá saber o porquê ?!

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    9. Estes posts vale a pena ler!

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